Acima de tudo, uma das maiores críticas feitas ao gênero de investigação é sobre a estrutura regrada usada ao escrever romances policiais.
De acordo com estudiosos, para se encaixar no gênero a história precisa ter, no mínimo, um crime, um detetive e uma solução final racional.
Durante a Era Dourada, no início do século XX, contudo, mais regras para escrever romances policiais foram sendo adicionadas à essas.

Essas regras vieram pelas mãos de Ronald Knox e S.S. Van Dine. Como resultado, eles acabaram dando à estrutura do gênero uma aparência de “receita de bolo”.
Alguns críticos, inclusive, utilizam essa definição para descrever pejorativamente o gênero.
Dessa maneira, escrever romances policiais seria tão simples quanto responder a um formulário com campos previamente preenchidos.

As regras de Knox e Van Dine
Em 1928, Ronald Knox e Van Dine lançaram simultaneamente, embora sem colaborar um com o outro, séries de regras que deveriam ser seguidas por quem quisesse escrever romances policiais.
Ronald Knox foi um padre inglês da igreja anglicana e lançou diversos romances policiais entre 1925 e 1937.
Além disso, ele ganhou popularidade quando estabeleceu no prefácio do livro Best Detective Stories, o qual editou, os dez mandamentos do escritor de romance policial.
Estas regras de Knox eram:
- O autor deve mencionar o criminoso na primeira parte da história, mas não deve ser alguém que o leitor encare como suspeito.
- Todos os agentes sobrenaturais serão descartados por uma questão de disciplina, tudo deve ser explicado cientificamente.
- Não é admissível que exista mais de uma sala ou passagem secreta.
- Não deve-se usar venenos desconhecidos, nem qualquer aparelho que exija uma explicação científica. Significando que ficção científica não é permitido.
- Nenhum chinês deve ser personagem na história.
- Nenhum acidente deve jamais ajudar o detetive, nem ele deve sempre ter uma intuição inexplicável que o ajude a tomar decisões.
- O detetive não deve cometer ele mesmo o crime.
- Todas as pistas devem ser vistas pelo leitor.
- O “amigo bobo” do detetive não deve esconder os pensamentos que passam por sua mente, sua inteligência não deve ser pouca, mas ele precisa ser ligeiramente menos inteligente que o leitor médio.
- Não deve-se usar irmãos gêmeos ou personagens duplos em geral, apenas quando o leitor estiver preparado para eles.

Enquanto isso, estas eram as regras de S.S. Van Dine:
Van Dine foi escritor e crítico americano, autor de diversas obras entre 1926 e 1939. Lançou um artigo na American Magazine em que contava suas próprias regras.
De acordo com ele, o autor de romance policial deveria seguir as 20 regras descritas abaixo:
- O leitor deve estar em condições iguais às do detetive para resolver o caso.
- O autor não deve incluir truques ou enganos, exceto aqueles colocados pelo assassino antes do detetive.
- Não deve haver interesse romântico na história.
- Tanto o detetive quanto assistentes de investigação podem ser considerados culpados e esse truque será considerado um pretexto falso.
- O culpado deve ser descoberto através de deduções lógicas, não por coincidências ou confissões.
- Toda história deve ter um detetive e este, deve descobrir a solução.
- Sempre deverá haver um cadáver.
- Deve-se resolver o mistério por meios naturais, sem adições sobrenaturais.
- Não deve haver mais de um detetive.
- O culpado deve ser um personagem que tenha desempenhado um papel mais ou menos importante, com quem o leitor esteja familiarizado.
- Um servo não deve ser o culpado.
- Deve haver apenas um culpado.
- As sociedades secretas, a camorra, a máfia e etc. não tem lugar na história de um detetive.
- Os métodos de assassinato e os investigação devem ser racionais e científicos.
- O enigma deve estar presente e o leitor o verá se for tão inteligente quanto o detetive.
- Um romance policial não deve conter longas passagens descritivas ou questões secundárias.
- Um profissional do crime nunca deve levar um crime à história ficcional de detetive. O departamento de polícia é quem tem responsabilidade por crimes cometidos por bandidos, eles não devem vir de brilhantes autores e detetives amadores.
- O crime nunca pode ser o resultado de um acidente ou suicídio.
- Os motivos que induzem o crime nas histórias de detetive devem ser pessoais.
Recursos que nenhum autor deveria usar:
Como resultado, Van Dine acrescentou em seu último item uma série de recursos e dispositivos que nenhum autor que se preze usaria. São estes:
- Determinar a identidade do culpado, comparando a ponta de um cigarro deixada na cena do crime com a marca fumada por um dos suspeitos;
- Sessões espirituais falsas para assustar o culpado em manter afastado;
- Forjar impressões digitais;
- O álibi fictício;
- O cão que não late e, assim, revela o fato de que o intruso é familiar;
- A final pinagem do crime em um duplo [gêmeo], ou um parente que se parece exatamente com o suspeito, mas a pessoa, inocente;
- A seringa hipodérmica que deixa em knockout e cai;
- A incumbência do assassinato em uma sala trancada depois de a polícia ter realmente descoberto;
- O teste de associação de palavras para a culpa;
- A carta da cifra, ou código, que é finalmente desvendado pelo detetive.
Mesmo que os autores tenham pensado nas regras em separado, a proposição contém muitos pontos em comum e acabam se completando.
Dessa maneira, é interessante como elas ajudaram a delimitar o gênero que conhecemos hoje e como as histórias conseguem ser diferentes seguindo o mesmo pacote de diretrizes.
Por outro lado, é inegável que a estrutura se torne bastante engessada, justificando as críticas.

Explicando algumas das regras
É interessante, nesse ínterim, explicar algumas das regras que Knox e Van Dine fixaram, especialmente a proibição de personagens chineses trazidas por Ronald Knox.
P.D. James argumenta essa questão, por fim, em seu livro Segredos do Romance Policial, lançado em 2012.
Para ela, proibir personagens chineses é um pouco difícil de entender, mas Knox poderia estar falando do personagem Fu Manchu.
Esse personagem era um gênio oriental do crime, criado por Sax Rohmer, e dessa maneira, acabou contribuindo para um estereótipo ruim sobre pessoas asiáticas.
Outra regra interessante de analisar, assim sendo, e que aparece em ambas as listas é a restrição quanto a elementos sobrenaturais.
O romance policial é um gênero bastante racional e desafiador, ou seja, calcado na realidade.
Portanto, resolver o crime com a ajudar de forças que o leitor não sabe de onde vieram poderia comprometer o sentido da história.
Além disso, solucionar o mistério usando ajuda não-humana leva a história para outro gênero literário que não o romance policial.
Este artigo é parte de um estudo sobre literatura policial e a representação de museus no gênero. Assim sendo, se você quiser conferir o conteúdo completo, acesse este link.